domingo, 22 de abril de 2007

Fiquei com vergonha


Enquanto isso... lemos no suplemento Megazine, do O Globo, dessa semana (17/04/07): duas páginas falando de como os indígenas estão utilizando a internet, tanto para se comunicarem, divulgarem sua cultura, como para aprenderem espanhol, por exemplo; mostrando como homens e mulheres podem se beneficiar da tecnologia dos computadores, nos lembrando a idéia primordial de que toda tecnologia é criada para servir ao ser humano.

Em seguida, somos nocauteados, com uma reportagem que conta como alguns colégios particulares aqui do Rio estão preparando os meninos e meninas do Ensino Fundamental para o Vestibular!!!! Com testes simulados aos sábados, para já irem treinando... desde a quinta série!

É a instituição escolar torturando cada vez mais cedo!

O que é isso, professores???

Como é que pessoas teoricamente preparadas para lidar com crianças e jovens nas escolas conseguem defender essa idéia? O que está acontecendo? Perdemos completamente a razão?

Estamos esquecidos do nosso papel de educadores? O papel da escola se resume a isso? Preparar para o vestibular? Quer dizer que o certo, que a coisa boa a se fazer é adestrar nossos jovens cada vez mais cedo?

Ou seja, ao invés de combatermos um sistema que é injusto, incoerente e massacrante, nós o fortalecemos, com a desculpa de que estamos preparando os jovens.

Não acredito que professores comprometidos com o exercício da cidadania de seus alunos, preocupados com a formação de pessoas de bom caráter, interessados em construir conhecimento e a autonomia com esses jovens concordem com esse esquema de trabalho.

Que equívoco, professores, que equívoco!

Será que nem os resultados do ENEM fazem os professores perceberem que esse esquema não dá certo? O ENEM pressupõe que os alunos estejam aprendendo a pensar, articulando conhecimentos de áreas variadas e que saibam criar argumentos para defender suas idéias através da linguagem escrita.

A UERJ e a UFRJ – cada uma a seu modo - também esperam alunos pensantes, que escrevam com desenvoltura, e não alunos que decorem esquemas e técnicas.

E o que se faz é tentar enquadrar isso num modelito que sirva para todos, criando turmas especialmente adestradas para responder questões supostamente pré-formatadas.

E, por favor, não me venham com a história de que estamos atendendo os anseios dos pais ou que estamos preparando para o futuro.

Escola não é curso preparatório! Escola não é lugar para manutenção e confirmação do que não é bom. Escola não pode ser excludente.

Nós, educadores, somos responsáveis pelo debate e pelo esclarecimento pedagógico do que deve ser feito na escola. E escola é lugar de formar gente em suas potencialidades e diferenças.

Escola é lugar de compreender e aprender para o mundo que estamos vivendo agora, e não para um futuro que sequer sabemos qual será.

Escola é lugar de se pensar alternativas para melhorarmos o que não está bom, de se aprender a lutar pelo bem estar coletivo.

Escola é lugar de formamos pessoas para respeitarem-se umas às outras, para serem solidárias, justas e dignas.

Escola é lugar de ampliar e produzir conhecimentos.

Escola é lugar de transformação.

E se a sociedade está do jeitinho que está, cheia de gente “sabida e esperta, que só sabe levar vantagem em tudo”, é porque temos formado gerações e gerações, sem nos preocuparmos com as transformações necessárias, preocupados que somos com a manutenção de uma coletividade perversa, que já se mostrou suficientemente incapaz de acolher os verdadeiros valores da vida humana.

Os grandes pensadores-educadores desse país, que pensaram uma escola que dignificasse o ser humano, como Paulo Freire e Darcy Ribeiro, devem estar revirando no túmulo.

Se os colegas não considerarem nada disso como relevante, que pensem em suas vidas de estudantes e lembrem-se da tortura das “semanas de provas”, da angústia e da ansiedade que elas causavam e, pelo menos, reflitam sobre os motivos de estarmos até hoje reproduzindo essa situação e, pior, antecipando nas vidas de nossos alunos esses momentos doentios.

Convenhamos, isso não faz bem a ninguém.

Cadê os educadores dessa cidade? Por favor, apresentem-se, pra eu não morrer de vergonha.





12 comentários:

Nanda disse...

Bastante pertinente e atual as suas colocações!

Também fico indignada com essa "cultura do vestibular", em que os alunos vão aprendendo desde cedo a usar macetes ao invés de aprender a refletir, questionar e, através deste trabalho de ação e reflexão, mudar o mundo - sim, eu acredito que a educação pode mudar o mundo.

Parabéns!!

Fátima Franco disse...

Oi, Denise:
parabéns a você e aos professores colaboradores, pelo conteúdo do blog. Li as postagens e as reflexões são excelentes.
E quanto ao treinamento para o vestibular, acho incrível que alguém ainda tenah isto como objetivo de aprendizagem. Vou linkar suas reflexões, no blog sobre leitura, ok?
Abs

Anônimo disse...

Olá Denise, boa tarde!
Recebi teu e-mail do "nosso grupo" e vim curiosa conhecer tua página!hehehe![sou assim mesmo, viu?!Não se assuste!^^!]
Confesso estar impressionada com os tus textos, principalmente o "Sobre todas aquelas coisas que “temos que” fazer"; adorei mesmo!![Aliás, poderia copiá-lo??Não para publicar na minha página, mas para mostrar a alguns colegas.(aguardo tua resposta antes de fazê-lo)].
Qto à tua idéia de lançar a construção de blogs nas mãos dos alunos, estou com o mesmo projeto nos colégios em que trabalho, até mesmo p manter um certo intercâmbio entre meus alunos.Tenho a mesma dificuldade q vc citou em teu e-mail, então acabei optando por não esperar meus colegas profs, e tomei a iniciativa.
Até o próximo final de semana devo ter os endereços de cada blog, e os repasso a vc, caso queira dar uma olhada.
No mais, por hora é só.
=]
[]'s
E seja bem-vinda ao grupo!!

Marcilene disse...

Denise

parabéns pelo trabalho e bem vinda a comunidade.

Marcela Dâmaris disse...

Olá!
Faço de suas palavras as minhas...
Compartilho com tudo o que escreveu e assino embaixo.
Até quando a escola ficará preocupada com IN-FORMAÇÃO, que como o próprio nome diz... não forma!
A cada dia que passa me convenço que educar não é simplesmente transmissão de informação, não é preparar para o vestibular...
Cara colega, vamos acreditar! Um dia, isso muda!
Um super bj.

Jenny Horta disse...

Ainda sobre os indígenas: postei no meu blog, mostrei para os meus pequeninos o site www.indiosonline.org.br. Os professores geralmente utilizam (principalmente os das grandes cidades) o pretérito ao falar e escrever sobre os índios, como se eles não existissem mais! Os índios viviam em tribos.... viviam???

Jenny Horta disse...

Aqui em Niterói, existem "Vestibulinhos" em algumas grandes escolas da classe média, para ingressar na primeira série do básico!
Esta é a educação para competição, onde se aprende que só os fortes sobrevivem. Para sobreviver tem que estudar na Federal, terminar a Faculdade pra comprar seu primeiro carro importado, seu celular da hora, etc etc. Este é o futuro de sucesso....é uma questão ideológica.

Anônimo disse...

Denise,

Olá, dei uma lida nos textos e ADOREI.Parabéns a toda a equipe!Penso que a escola deve preparar o aluno para a vida, para a tomada de decisões, para a busca daquilo que realmente importa e fará diferença em sua vida.
Ainda temos um longo caminho a percorrer não é mesmo ?

Um grnade abraço e sucesso sempre
Gládis
Joinville SC

Anônimo disse...

Oi Denise! Compartilho de tua indignação. É inadmissível que nos dias de hoje, quando tanto se discute sobre os problemas na educação, que ainda existam "professores" preocupados em treinar para o vestibular. Ainda bem que existem educadores como tu e os demais do "nosso grupo". Parabéns pelo teu trabalho.

Rosangela Gomes disse...

Morre de vergonha não, amiga!
Ainda há muito pelo que brigarmos!
E... Não estamos sós.
Indignação também não basta.
Precisamos construir uma ação indignada. Soltar o verbo mesmo! E a mão! (não entenda isso como uma apologia à violência)
Mas, precisamos todos, onde colocarmos nossas mãos, deixarmos a marca profunda desta indignação e isso só é possivel através de um exercício diário de questionar, sempre que nos pusermos diante dos alunos: Por quê? Para quê? Para quem? estamos ali.
Sabe o que eu penso em relação a este costume de doutrinar os moleques desde as mais tenras idades para o vestibular?
Isso é muito mais um fantasma que nós mesmos (educadores)criamos porque estamos habituados a termos algozes, habituamo-nos a chibatas, habituamo-nos a sermos escravos, ou então ... capatazes (estes gozam de algum prestígio social).
Nós, professores, ainda não percebemos a liberdade que temos e, o pior, temos medo dela.
Os PCNs em momento algum citam os exames vestibulares como parâmetro de ensino, ao contrário e, memso assim, estamos sempre optando pelo que já existe sem fazer estes questionamentos acima na hora de pôr a mão na massa. Aí, nossa prática não combina com nosso discurso. Se não educamos para o vestibular, educamos para quê???
Os índios, estes, me parece, já perceberam o real valor da escola porque ela é uma opção para eles... e ela é nos moldes exatos de suas necessidades e aspirações. Ele não está subjugado a ela. Ela é um instrumento em suas mãos.
Eles sabem porque estão nela e se fortalecerão a partir dessa concepção. Nós, devíamos aprender com eles!
Bjs, Rô

Anônimo disse...

Uma colega leu e divulgou o blog. Muito bom, não devemos desanimar, o que aliás acho que é uma característica do professor!

Anônimo disse...

ler todo o blog, muito bom