terça-feira, 26 de agosto de 2008

Aguardando comentários...

Caríssimos, inspirada pela profa. Érika, trouxe alguns trechos de FOUCAULT, e aguardo seus comentários por aqui, para irmos amadurecendo as idéias e para que possamos discutir alguns aspectos relativos ao tema na próxima reunião de planejamento, de uma maneira mais articulada.

O texto teórico é para nos ajudar a pensar, mas nossos comentários devem se aproximar da prática docente o mais que pudermos, certo?

Nosso desafio é: como atuar cotidianamente com os nossos alunos, equilibrando liberdade e disciplina?
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A tecnologia de poder e de controle disciplinar que começa a se constituir a partir dos séculos XVII e XVIII consiste em um sistema de controle social por meio da conjugação de várias técnicas de classificação, seleção, vigilância e controle.

No século XIX, observava-se o poder disciplinar presente nos asilos psiquiátricos, nas penitenciárias, na educação vigiada e seus reflexos ainda atingem a sociedade atual.

A análise do panóptico é decisiva para evidenciar um sistema que organiza princípios de disciplina e vigilância; o olhar do outro que imprime a vigilância e consolida um sistema de normas, faz surgir e mantém os corpos dóceis. “É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado”

A descrição do panóptico (que permite a visão de todas as partes ou elementos) corresponde à seguinte estrutura:

“O princípio é, na periferia, uma construção em anel; no centro, uma torre: esta possui grandes janelas que se abrem para a parte interior de um anel. A construção periférica é dividida em celas, cada uma ocupando toda a largura da construção. Estas celas têm duas janelas: uma abrindo-se para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, dando para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de um lado a outro. Basta então colocar um vigia na torre central e em cada cela trancafiar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um estudante. Devido ao efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se na luminosidade, as pequenas silhuetas prisioneiras nas celas da periferia. Em suma, inverte-se o princípio da masmorra: a luz e o olhar de um vigia captam melhor que o escuro que, no fundo, protegia. A visibilidade é uma armadilha.”

Divididas por paredes e com a parte frontal exposta para observação do Diretor por uma torre central, no alto, permitiria que o Diretor pudesse ver sem ser visto e permitiria um acompanhamento minucioso da conduta do detento, aluno, militar, doente ou louco.

A questão da visibilidade no modelo panóptico, onde cada um é visto de frente e os muros laterais impedem que haja contato entre os companheiros, mostra barreiras simbólicas e às vezes, materiais, que ainda podem ser observadas em variadas instituições sociais:

“[Cada um] é visto, mas não vê; objeto de uma informação, nunca sujeito numa comunicação; (...) essas celas bem separadas, implicam uma invisibilidade lateral. E esta é a garantia da ordem. Se os detentos são condenados não há perigo de complô, de tentativa de evasão coletiva, projeto de novos crimes para o futuro, más influências recíprocas; se são doentes, não há perigo de contágio; loucos, não há risco de violências recíprocas; crianças, não há “cola”, nem barulho, nem conversa, nem dissipação. Se são operários, não há roubos, nem conluios, nada dessas distrações que atrasam o trabalho, tornam-no menos perfeito ou provocam acidentes.”

“Esses métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e lhes impõe uma relação de docilidade-utilidade, são o que podemos chamar as ‘disciplinas’”.

Os mecanismos da disciplina são exercidos a partir de uma cadeia hierárquica, vindos do poder central e se multiplicam em uma rede de poderes interligados e capilares. O poder é exercido sobre corpos; o ser humano é selecionado e classificado individualmente, não por suas singularidades, mas com o objetivo de controlá-lo. A intenção é de analisar em minúcias, em micro seções individuais; o poder é exercido sobre corpos individualizados, para melhor conhecer e controlar cada célula social.

Nesta perspectiva, a escola compreende um dos espaços onde se percebe a busca da utilização de técnicas e mecanismos disciplinares, numa versão micro, que se destinam ao estabelecimento de um espaço disciplinar que atua da seguinte maneira:

“O espaço disciplinar tende a se dividir em tantas parcelas quando corpos ou elementos há a repetir. É preciso anular os efeitos das repartições indecisas, o desaparecimento descontrolado dos indivíduos, sua circulação difusa, sua coagulação inutilizável e perigosa; tática de antideserção, de antivadiagem, de antiaglomeração. Importa estabelecer as presenças e as ausências, saber onde e como encontrar os indivíduos, instaurar as comunicações úteis, interromper as outras, poder a cada instante vigiar o comportamento de cada um, apreciá-lo, sancioná-lo, medir as qualidades ou os méritos. Procedimento, portanto, para conhecer, dominar e utilizar. A disciplina organiza um espaço analítico.”

Ainda segundo Foucault, data do século XVIII a ordenação nas classes escolares por fileiras; uma das modificações técnicas do ensino elementar: a organização de um espaço serial. Nas sociedades disciplinares, os indivíduos são distribuídos no espaço por meio das técnicas de enclausuramento; há o controle temporal e normatização de corpos e forças produtivas para obter maior eficiência.

“As disciplinas, organizando as “celas”, os “lugares” e as “fileiras” criam espaços complexos (...) marcam lugares e indicam valores; garantem a obediência dos indivíduos, mas também uma melhor economia do tempo e dos gestos. São espaços mistos: reais, pois que regem a disposição de edifícios, de salas, de móveis, mais ideais, pois projetam-se sobre essa organização caracterizações, estimativas, hierarquias. A primeira das grandes operações da disciplina é então a constituição de “quadros vivos” que transformam as multidões confusas, inúteis ou perigosas em multiplicidades organizadas.”


9 comentários:

Anônimo disse...

Caros Amigos,
Todas as vezes que o assunto disciplina ou qualquer assunto que se refira a Educação na Escola,aparece,fico preocupado, não querendo cair no lugar comum.Por outro lado acredito que o lugar comum as vezes é necessário para reforçar boas idéias ou abortar idéias obsoletas.
Estou em sala de aula desde 1989 e no meu primeiro conselho de classe ouvi palavras sobre a disciplina dos alunos que ouço até hoje e percebo que os educadores se dividem em dois grandes grupos.
O Primeiro grupo:
" falta limites"
"antigamente não era assim"
"a família está me crise"
"os pais não atuam"
O segundo grupo:
"a escola é chata"
"o aluno tem problemas psicológicos"
"temos que partir do zero"
De uma maneira geral nenhum dos grupos resolveu ir ao fundo da questão para criar algo novo em que coisas boas e ruins do passado também devam ser avaliadas e que ações novas devam ser incoporadas.
Penso que em nosso Colégio há um projeto que contempla disciplina e liberdade.
Penso que há um impasse muito grande, pois há alunos,pais e professores acreditando que esta liberdade é falta de regras.
Somos educado num único modelo disciplinador, que as vezes nos "vende" a idéia de que o sucesso de tal Colégio se deve a sua disciplina aos moldes do modelo analisado por Focault.
Falta de ética, falta de educação sempre existiu e o nosso velho modelo não conseguiu diminuir ou dizimar os seus efeitos.
Que tal anotar e dividir medidas disciplinares "diferentes" que foram postas em práticas e trouxeram bons resultados?
Em algumas Escolas talvez seja mais fácil o trabalho.Muitas escolas disciplinam os alunos de uma forma que não é possível manifestação contra um projeto educacional que não tem muito sentido para os alunos.
As vezes encontro muitos ex-alunos pela vida que conseguiram utilizar uma série de conhecimentos e comportamento adquiridos da escola, no mundo do trabalho, mas ainda assim só conseguem ver o lado utilitarista deste conhecimento e de regras disciplinares.
Acho que acreditamos numa Educação muito mais ampla.

Rosangela Gomes disse...

Certamente, quando o assunto é liberdade/disciplina, o caminho mais curto, utilitarista e regulador, que faz tudo parecer mais fácil, um mar de rosas, na verdade não o é. Visto sob este enfoque a disciplina é meio e fim da educação.
Já trabalhei em escolas assim e abri mão exatamente porque não acredito nisso. Não vi resultados satisfatórios neste esquema.Não a longo prazo.
De um lado, o discurso é "formar o cidadão crítico, desenvolver todas as suas potencialidades e blá blá blá... e de outro, o
autoritarismo que se faz evidente desde a elaboração do currículo até a prática do dia a dia refletida na arrumação da sala, no distanciamento e frieza como as questões familiares/pessoais são tratadas etc.
Tudo é generalizado para seres que são individuais, únicos...

O que propomos aqui é educar com liberdade e para ela. O que desejamos é aproveitar ao máximo todas as oportunidades para debater com os alunos o sentido da liberdade e o valor das regras.
A disciplina aqui é um fim não um meio. Trabalhamos para que os alunos se construam seres autônomos e por isso mesmo, regrados por regras que são compreendidas e aceitas e não apenas seguidas
Isso só é possível se tivermos a humildade de reconhecer nossas dificuldades em relação a isso exatamente porque não fomos educados para tal.

Nós precisamos, urgentemente, perceber em nós comportamentos que nos foram impostos como ideais, corretos, como parte de uma boa educação e refletir sobre toda a ideologia que está por trás disso...
Não incentivaremos a criticidade de nossos alunos se não nos dispusermos a também sermos seres críticos.
Não se trata de abolir as regras sociais mas de refletir sobre elas. Não podemos ser escravos delas, nem fazer de nossos alunos escravos, robôs...

É óbvio que lidar com tudo isso é muito mais difícil, cansativo e a sensação de impotência é muito maior. Mas deve ser só uma sensação. Não podemos nos tornar impotentes diante deste desafio.

Se uma nova prática não funciona de imediato é porque a ideologia que a inspirou não está correta ou porque estamos lidando com pessoas reais, buscando tocá-las de verdade e isso demanda paciência, demanda reformulação constante, demanda auto-controle, auto-conhecimento e conhecimento do outro? Tudo que não tem feito parte do cardápio escolar.

A escola, desde que foi inventada, trabalha com a generalização, com padrões, com receitas prontas para cada situação. Só que a cada dia nos deparamos com situações diversas. O que dá certo num dia, não dá no outro. O que surte efeito negativo num aluno, para outro funciona que é uma beleza.
A única forma de acertarmos mais é, independente da disciplina que lecionamos, independente do conteúdo que estejamos abordando, que estes sirvam-nos a melhor conhecer cada um. Não podemos passar o ano inteiro "atirando no escuro"

Precisamos, seres intelectuais que somos, adultos, capazes de prever determinadas consequências, usar isso a nosso favor. Mas, antes, precisamos conhecer mais a terra do canteiro onde estamos semeando e não devemos abrir mão de dar a cada pedacinho deste canteiro, a cada uma das flores, um tratamento diferenciado: o adubo, quantidade de água, luminosidade e calor adequados para cada uma.

Fraternalmente,

Sabine Mendes disse...

Oi, gente!

No texto do Foucault ele diz assim:"[Cada um] é visto, mas não vê; objeto de uma informação, nunca sujeito numa comunicação".

Acho que isso se aplica tanto a alunos quanto a professores.

No início do ano, tínhamos o plano de juntos vencer a barreira entre nós, professores, nos comunicando melhor e a barreira entre nós e os alunos, buscando uma comunicação real com eles.

Buscamos fazer isso com um modelo de planejamento em conjunto que construísse links entre as disciplinas e conteúdos estanques pelas quais cada um de nós é responsável. Eu acreditava que, se fossemos capazes de construir esses links entre nós, se este fosse o tema e o objetivo de nosso trabalho cotidiano, os links apareceriam entre os alunos, facilitaríamos a vida deles, geraríamos um modelo em que cada um de nós seria um exemplo de como "tudo tem a ver com tudo" - já que reclamamos sempre que eles não vêem a relação entre nada. Mas será que nós vemos?

Eu disse na nossa última reunião e repito: para mim a questão da disciplina não é uma questão de transformar o aluno em demônio ou santo (como parecem querer fazer os 2 grupos que o PH comenta que sempre vê nas escolas). Para mim, a questão da disciplina passa pelo sentido que nossas aulas têm, por como estamos nos vendo em sala e por planejamento.

Para mim, as piores épocas em termos de disciplina são as épocas em que estamos mais cansados, perdidos, sem saber o que fazer em sala ou sem planejar.

Enquanto não resolvermos a questão do planejamento, dos links e da comunicação entre nós, os problemas de disciplina vão continuar. Quanto mais nos afastarmos desta questão, piores serão os problemas de disciplina.

Beijos
sabine

H23 disse...

olá a todos,
aqui tenho muito mais a aprender do que a falar.
Concordar com o PH sobre trazer para o conjunto, ações eficientes. Não tenho nada a acrescentar nisso, sinto-me ineficiente. Segue a fala da RO e me deparo com meu problema: a falta de analise do meu proprio comportamento, do que espero, num molde que eu mesma pretendo superar; e uma luz: saber com o que está lidando e principalmente com quem.
E sigo na fala da Sabine, ratificando "as piores épocas em termos de disciplina são as épocas em que estamos mais cansados, perdidos, sem saber o que fazer em sala ou sem planejar".
E nada mais tenho a acrescentar, porque nesta pior época, onde o cansaço quer falar mais alto, tive aqui um, não, vários bons motivos para continuar vigilante nos intentos e principalmente nas pessoas.
Realmente peço desculpas por falas na primeira pessoa, não sei como contribuir aqui, mas posso confirmar que aprendi muito.
(escutando a vozinha da Denise dizendo, viu, não falei que era pra ler? que ia ser bom?)
e foi mesmo Denise, foi mesmo.

Rosangela Gomes disse...

Hoje, uma grande amiga, numa conversa sobre mil coisas, teceu um comentário sobre um CD que ouviu, de uma ciranda que mais parecia uma marcha... contradição pura!

Esta imagem ficou na minha cabeça e queria compartilhar com vocês.
Acho que o que vou dizer sintetiza um pouco nossas postagens anteriores e, principalmente, reforça a idéia de que não podemos trabalhar isolados. É o seguinte:
Não podemos nos colocar um ao lado do outro, numa reta horizontal ou um atrás do outro, numa reta vertical e marchar contra a indisciplina. Precisamos construir uma ciranda.

Ciranda, é circular... É todo mundo de mãos dadas, nenhuma energia sendo disperdiçada e sim, retroalimentada.

Em momentos de crise, de maior cansaço etc., precisamos ser cirandeiros e incorporar nesta ciranda tantas individualidades quanto pudermos: professores, alunos, pais...

A ciranda, quando assistida de fora, não permite distinguir seu começa nem o seu fim. Assim são nossas ações. Mesmo quando pensamos que estamos trabalhando isolados em nossos planejamentos e atividades de sala, estamos a influenciar no trabalho do outro.

Numa ciranda a trajetória permite aos seus participantes retornar inúmeras vezes ao ponto de partida e isso não é motivo de angústia. Faz parte do show... Mas, com certeza, a cada volta dada os participantes não estão se sentindo da mesma forma que na rodada anterior. Tornam-se mais leves, mais discontraídos e tomados pelo sabor da música.Em educação, é a mesma coisa: precisamos estar sempre voltando a debater sobre os mesmos valores, sobre questões comportamentais que julgávamos já estarem superadas mas, certamente, estamos já de alguma forma modificados pela experiência anterior. É a velha história "Nada se perde, tudo se transforma"

Uma ciranda tem um ritmo próprio, uma cadência. No nosso caso, este ritmo e cadência são a filosofia da escola. Compreender e abraçar esta filosofia é fundamental.

Uma ciranda transmite sempre alegria, simplicidade e tolerância - que é a arte do acolhimento do diferente.
Uma ciranda é pura emoção!

E então, vamos cirandar?

Carinhosamente,

EnyA. disse...

Acredito nesta "docilidade". E transportando-nos para o Séc. XXI, percebo q os problemas eram e são os mesmos... Indivíduos tentando persuadir os outros. Uma tentantiva incansável, exaustiva, q Foucault analisou bem. Não tem como chegar a conclusões, cada indivíduo é singular em suas atitudes... Estamos em constante evolução (graças a Deus)... Cada ser humano será o seu sucesso. Depende dele, claro, tb se um belo professor-educador o nortear, orientar para as enfrentar angústias da existência humana.

EnyA. disse...

Acredito nesta "docilidade". E transportando-nos para o Séc. XXI, percebo q os problemas eram e são os mesmos... Indivíduos tentando persuadir os outros. Uma tentantiva incansável, exaustiva, q Foucault analisou bem. Não tem como chegar a conclusões, cada indivíduo é singular em suas atitudes... Estamos em constante evolução (graças a Deus)... Cada ser humano será o seu sucesso. Depende dele, claro, tb se um belo professor-educador o nortear, orientar para enfrentar as angústias da existência humana.
Bjos.
Enya :-)

PH disse...

2) "Na sociedade moderna a relação econômica vai se tornando fundamento da profissionalização. Mas sob a perspectiva da integração entre trabalho, ciência e cultura, a profissionalização se opõe à simples a formação para o mercado de trabalho. Antes, ela incorpora valores éticos-políticos e conteúdos históricos e científicos que caracterizam a práxis humana. "

A reforma da educação profissional em curso no Brasil desde 1997, a partir do Decreto n 2.208 e das Diretrizes e Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Profissional de Nível Técnico, apresenta o conceito de qualificação profissional pela noção de competência. Essa noção está intimamente associada as exigências do mercado de trabalho que é dominado , de uma maneira geral, por grandes corporações transnacionais.

Apresente o enfraquecimento da dimensão social e a despolitização do conceito de trabalho nos PCNs.

PH disse...

2) "Na sociedade moderna a relação econômica vai se tornando fundamento da profissionalização. Mas sob a perspectiva da integração entre trabalho, ciência e cultura, a profissionalização se opõe à simples a formação para o mercado de trabalho. Antes, ela incorpora valores éticos-políticos e conteúdos históricos e científicos que caracterizam a práxis humana. "

A reforma da educação profissional em curso no Brasil desde 1997, a partir do Decreto n 2.208 e das Diretrizes e Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Profissional de Nível Técnico, apresenta o conceito de qualificação profissional pela noção de competência. Essa noção está intimamente associada as exigências do mercado de trabalho que é dominado , de uma maneira geral, por grandes corporações transnacionais.

Apresente o enfraquecimento da dimensão social e a despolitização do conceito de trabalho nos PCNs.